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Homologação de Acordo Extrajudicial: Fraude, Vício de Consentimento e o Papel do Poder Judiciário

Braskem

A homologação de acordo extrajudicial é uma prática cada vez mais comum na Justiça do Trabalho brasileira, introduzida pela Reforma Trabalhista de 2017. No entanto, como destacado no processo TST-ROT-931-78.2021.5.06.0000, julgado pela Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-II) do Tribunal Superior do Trabalho (TST), existem casos em que essa prática é usada de forma inadequada, levando a fraudes e vícios de consentimento. Sob a relatoria do Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, o Tribunal tratou de um caso que exemplifica os desafios e a necessidade de uma atuação proativa do Poder Judiciário na fiscalização desses acordos.

O Contexto do Caso

No caso em análise, o trabalhador firmou um acordo extrajudicial, mas sem a devida assistência de um advogado próprio e regularmente constituído. O advogado que deveria representar os interesses do empregado havia sido, na realidade, contratado pela empresa. Isso levou à caracterização de fraude e vício de consentimento, já que o empregado não tinha plena consciência dos termos do acordo e dos direitos que estava renunciando.

O processo TST-ROT-931-78.2021.5.06.0000 trouxe à tona uma questão importante: a função do advogado no acompanhamento desses acordos deve ser de completa independência, garantindo que o trabalhador compreenda plenamente os termos do negócio jurídico e os direitos que está abrindo mão. Nesse caso, o Tribunal concluiu que a falta de assistência jurídica adequada violou os direitos do empregado, comprometendo a validade do acordo.

O Papel do Poder Judiciário na Fiscalização

O Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior destacou que o Poder Judiciário tem a responsabilidade de fiscalizar a lisura e a regularidade dos acordos extrajudiciais, especialmente quando há indícios de fraude ou colusão. Embora a lei não exija que o magistrado realize uma audiência com as partes envolvidas, é altamente recomendável que o juiz adote uma postura proativa, ouvindo as partes diretamente antes de homologar qualquer acordo. Isso é crucial para evitar que acordos fraudulentos ou forçados sejam validados.

No caso em questão, o magistrado de primeira instância não realizou audiência, limitando-se a analisar os aspectos formais do negócio jurídico. Contudo, a análise dos autos revelou que o empregado não tinha plena consciência de que estava assinando um acordo extrajudicial em que renunciava aos seus direitos trabalhistas, o que caracterizou uma fraude. A decisão da SBDI-II foi unânime em reconhecer que o acordo era inválido e que o consentimento do empregado estava viciado.

Fraude e Vício de Consentimento

O vício de consentimento ocorre quando uma das partes de um contrato ou acordo jurídico não tem plena consciência do que está assinando, seja por dolo, coação, erro ou fraude. No caso do processo TST-ROT-931-78.2021.5.06.0000, o Tribunal reconheceu que o empregado foi induzido a assinar um acordo sem entender plenamente suas implicações, especialmente porque o advogado que deveria representá-lo foi contratado pela empresa, criando um claro conflito de interesses.

A Reforma Trabalhista trouxe inovações importantes, permitindo que trabalhadores e empregadores resolvam conflitos sem a necessidade de litígios judiciais. No entanto, a experiência demonstra que, em alguns casos, esses acordos podem ser utilizados de forma abusiva por empregadores, especialmente quando os empregados não estão devidamente representados por advogados independentes.

A Responsabilidade do Advogado na Homologação de Acordos

O Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior também enfatizou que o advogado tem um papel crucial na representação de seus clientes em acordos extrajudiciais. A CLT, no artigo 855-B, § 1º, deixa claro que as partes envolvidas em um acordo extrajudicial devem ser representadas por advogados distintos. Isso é uma forma de garantir que ambas as partes recebam aconselhamento jurídico imparcial e adequado. No caso em análise, o trabalhador foi representado por um advogado escolhido pela empresa, o que comprometeu a independência da representação e resultou em um vício de consentimento.

Esse caso específico serve como um alerta para trabalhadores, empregadores e advogados sobre a importância de seguir rigorosamente as exigências legais ao firmar acordos extrajudiciais. O não cumprimento dessas exigências pode levar à invalidação do acordo, como ocorreu no processo TST-ROT-931-78.2021.5.06.0000.

O Resultado do Julgamento

Ao analisar o caso, a SBDI-II do TST decidiu por unanimidade conhecer o recurso ordinário e, no mérito, negou provimento, mantendo a decisão que reconheceu a fraude e o vício de consentimento. O Tribunal considerou que a ausência de um advogado independente, aliado à falta de uma audiência em que o trabalhador pudesse expressar sua posição de forma clara, comprometeu a validade do acordo extrajudicial.

Além disso, o TST determinou a expedição de ofícios à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e ao Ministério Público do Trabalho (MPT) para que fossem tomadas as devidas providências em relação à conduta do advogado que representou o empregado, em claro conflito de interesses.

Conclusão: O Que Essa Decisão Significa para o Direito Trabalhista?

O julgamento do processo TST-ROT-931-78.2021.5.06.0000 traz uma importante lição para o Direito Trabalhista brasileiro. Ele reafirma o papel do Poder Judiciário como fiscalizador dos acordos extrajudiciais, garantindo que os direitos dos trabalhadores sejam preservados e que fraudes e vícios de consentimento sejam rigorosamente combatidos.

Essa decisão também destaca a importância da atuação dos advogados de forma ética e independente, conforme previsto no Código de Ética e Disciplina da OAB. Os advogados que representam trabalhadores em acordos extrajudiciais têm o dever de garantir que seus clientes estejam plenamente cientes dos direitos que estão renunciando e das implicações dos acordos que assinam.

Homologação de Acordo Extrajudicial

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